Suponhamos que a internet seja um péssimo substituto para a fogueira

Roteiros e ficções

histórias = mundo

Uma lenda dos índios sul americanos diz que os contadores de história são responsáveis pela integridade física do mundo material. Pois é, como assim?, assim: ao compartilhar histórias, o storyteller, que neste chamam pajé, assume o papel sagrado de manter de pé o mundo em que sua tribo habita. O mundo chega até pnde as histórias chegam e se algo novo for descoberto, logo precisa ser formatado em história para que a tribo possa apreender. As compartilhar histórias, compartilhamos também as bordas do mundo que nos rodeia.

Dá uma olhada no museu. Nas tumbas egípcias, nos templos gregos, nas colunas assírias, nos poemas japoneses, nas estrelas maias, é tudo história definindo até onde vai a vida. Volta pro museu de uma capital desses países onde faz muito frio, desses países que pilharam o mundo. Vai até lá e encontrar um desses objetos. Senta na frente de uma dessas peças e assiste. Tem episódios, reviravoltas, ambientação, densidade, tempo, desenvolvimento de personagem. Tumba egípcia está para Netflix, épicos babilônicos talhados na pedra igual a Hollywood.

Hoje, porém, muitas vezes reduzimos esse poder em ferramenta de vender suco de laranja e mate com limão em caixinha do bem [publicidade tosca]. Outra redução muito comum é a contação de histórias morais, exibidas em horário nobre, que dizem como a tribo Brasil deve se comportar - baseada no código de ética do Alto Leblon e do Projac [novela].

Mas tudo isso é pouco demais.

Eu, que vim de lá pequeninho, vou entendendo como posso contar minhas versões do mundo que virá. Que não para de vir. Tento, quanto consigo, desenhar com texto os contornos desse mundo grávido de outro. Nesta seção estão misturados tanto roteiros de vídeo quanto textos de ficção.

Espaço Húmus - roteiro de vídeo

Lugar de experimentação, ateliê de linguagem, todos os participantes convidado a estudar a expressão que quiserem, a buscar o que vale a pena aprender. E eu fui testar um pouco de vídeo, entre outros, mas bastante vídeo. Tem muitos outros por lá, escolhi esses daqui porque são umas pérolas de experimentação e narrativa. Nestes trabalhos fiz produção e roteiro, junto com os parceiros Rafael Frazão e Bruno Fernandes, dá uma olhada.

Cidade Gentil - roteiro de vídeo

Cidade Gentil foi um trabalho intenso e delícia. Que pena que acabou. Quinze vídeos em dois meses, não, o prazo apertou, quinze vídeos em um mês, não, caramba, o caminhão não está pronto, quinze vídeos em quinze dias, beleza, mas os cinco primeiros deram ruim, tem que refazer, quinze vídeos em dez dias. Ficou bonito demais

O tema era lixo, difícil, fedido. O projeto, então transformou um caminhão de lixo em obra de arte dourada-neon e convidou 15 figuras para serem entrevistados na cabine-estúdio. Eu fui o roteirista, encontrei os convidados, escrevi suas histórias e o caminho que o caminhão percorreu em cada episódio.

Por enquanto, porém, o conteúdo está fora do ar. Como foi financiado pelas empresas de lixo da cidade de São Paulo e este é um ano eleitoral, os vídeos estão fora do ar até o final da campanha deste ano. Uma pena, eles estão lindões. Aguenta aí.

Terra sem Mal - roteiro de quadrinhos

A coisa mais legal que eu já fiz na minha vida. O post deste site que mais me dá prazer. Terra sem mal é uma ficção que está comigo há dois anos.

Os espíritos deste mundo acabaram quando os europeus inventaram a pólvora. Por que? Nossos mitos foram transferidos para Hollywood. Foram transferidos para outros mundos, viraram super heróis defendendo Nova Iorque. Nada contra NY, mas, por que?

E deuses lá morrem, agora? O que aconteceu com Tupã, que nasceu e cresceu aqui? Xangô, humilhado, foi acorrentado e trazido de navio para a America do Sul. Onde eles estão agora?

Para Terra sem mal, deus é um conceito que se manifesta na forma de gente.

Lindo demais, né? Rafael Coutinho, um dos mestres vivos do quadrinho brasileiro, ilustrou um capítulo de Terra sem Mal,

dá uma lida.

brenocastroalves@gmail.com